artigos.gif (2561 bytes) logjornal.gif (4234 bytes)

Ano IV - Nº 53 - Primeira quinzena de julho de 2002
 

Marketing Aplicado à Saúde

Eu fiz radiografia com
uma torturadora nazista
Eu estava na ante-sala esperando a minha vez.
Vi uma moça sair chorando.
Quando chegou a minha vez eu entendi porque ela estava chorando...

Dr. Roberto Caproni *

caproni.gif (4587 bytes)
 

Costumo dizer em meus cursos que eu só tenho dois medos: de dentista e de avião. Bem, pelo menos até agora! Eu sei que a odontologia moderna não dói. Mas bem no fundo do meu não consciente, tem um lugar que insiste em contrariar a minha razão e diz, com todas as forças: odontologia dói, odontologia dói, odontologia dói...

É bom que eu me explique melhor. Quando eu era criança, talvez entre os sete e onze anos de idade, foram feitos amálgamas em meus dentes onde a anestesia era uma pessoa mais forte me segurando. Naquela época, lá pelos anos sessenta como sabemos, a anestesia era utilizada apenas para fazer extrações. Anestesia para restaurações era um luxo ou coisa de fresco. Assim, cada um dos meus pré-molares e dos molares que me sobraram, carregaram durante mais de vinte e cinco anos, persistentes restaurações em amálgama que foram feitas " a frio". Isto me fez tomar pavor da odontologia e dos dentistas. Estranho isto! Eu acabei fazendo odontologia. Será que eu sou masoquista?!...

Bem, deixando estas amargas recordações para lá, vamos aos fatos.

Eu estava precisando urgentemente ir ao dentista. Mas em qual eu iria? Eu conheço tantos! Não me faltavam opções. Por que não ir naquele dentista que foi meu aluno, que eu sei que ele é um dos melhores, que trabalha com tecnologia de ponta? Ele poderia resolver os meus problemas. E quem sabe eu não precisaria nunca mais voltar ao dentista, eu pensei.

Relutei bastante. Dava para eu mesmo as mais profundas e convictas razões para adiar um pouco mais o tratamento. Afinal, sendo eu um dentista, eu sabia até onde os meus dentes poderiam agüentar adiamentos e mais adiamentos... E assim os anos se passaram!

Agora não dá mais para esperar. Eu pensei! O estado dos meus dentes já estão me comprometendo socialmente... não tem como esperar mais. E lá vou eu...

Marquei a consulta por telefone. Eu não queria nenhum privilégio pelo fato deste brilhante dentista ter sido meu aluno. Eu queria ser tratado como um cliente comum. Eu o estava procurando porque sabia que ele era o melhor. Fiz questão de deixar isto bem claro para ele, para que não pairassem dúvidas, antes do tratamento. E também na esperança de que ele me dissesse:

- Roberto, os seus dentes estão ótimos! Vamos apenas fazer uma limpeza profilática e está tudo bem! Você tem cuidado muito bem dos seus dentes. Meus parabéns...Meus devaneios duraram pouco tempo.

Ele examinou a minha boca e me disse sem rodeios:

- Roberto como você deixou os seus dentes chegarem nesta situação. E logo você que é um dentista também. Estas palavras de "consolo" deixaram bem claro que desta vez eu não escaparia...

Ele pediu para que eu fizesse as radiografias e eu pedi para ele o orçamento. Ele me disse que sobre o orçamento a gente conversaria depois, mas que as radiografias era para eu tirar imediatamente, ali ao lado mesmo.

E lá vou eu com um pedido de radiografias debaixo do braço. Me sento na ante-sala e fico lá esperando a minha vez... De repente sai da sala de radiografia uma moça, muito bonita por sinal, chorando. Eu fiquei com o coração palpitando, não pela beleza da moça, mas pelas razões que estavam fazendo ela chorar. Tentei me acalmar e pensei comigo mesmo: vai que ela brigou com o namorado e estava se abrindo com esta "simpática senhora" que estava radiografando os seus dentes. Perdido nestes pensamentos eu ouvi um brusco:

- É a sua vez!

Entrei para a sala com aquela sensação que as vacas, certamente, tem no corredor da morte num abatedouro... Eu não sentia os meus pés. Eu não percebia que estava andando. Eu apenas sabia que eu estava me deslocando para algum lugar... Eu me sentei no local indicado por ela. Ela fez a radiografia dos dentes anteriores. Até que não foi tão ruim assim.

Agora era a vez dos dentes posteriores. Ela posicionou o filme... Algo deu errado ela voltou e reposicionou o filme... algo ainda estava errado. O humor dela, que já não era bom, mudou... para pior!

Para se radiografar o terceiro molar inferior direto mandava a técnica, pelo menos naquela época, que se dobrasse levemente o filme para a região da língua, para não ferir a mucosa que recobre a região. Pois eu tenho certeza absoluta que ela fez isto. Só que para o lado contrário!

Quanto mais doía, mais ela apertava o filme que na visão dela estava sempre mal posicionado. E quanto mais ela apertava mais cortava, mais doía. Numa atitude reflexa eu percebi que algumas lágrimas rolaram pelo meu rosto. Eu não estava chorando porque homem não chora! Eu estava apenas sentindo uma dor aguda insuportável. Olhei nos olhos dela e percebi que ela estava tendo prazer com aquela cena macabra...

Quando terminou ela pediu "delicadamente" que eu esperasse ela revelar os filmes para ver se não seria necessário fazer novas radiografias. Eu esperei e rezei...

Não foram necessárias novas radiografias. Tecnicamente ela era competente, graças a Deus! Ali eu senti o poder da oração...

Saí dali a passos largos, entendendo porque aquela linda moça, que foi atendida antes de mim, chorou. Tanto ela quanto eu, e acredito que a maioria das pessoas que passaram por ali, fomos submetidos a sessões de tortura. Posso dizer que fomos torturados com o mesmo prazer que os nazistas torturavam os judeus nos campos de concentração.

Esta senhora, não sei bem se esta seria a denominação correta para ela, era uma mulher grosseira. Suas dimensões laterais superavam as suas dimensões verticais. Ela não tinha, definitivamente, o perfil para estar trabalhando onde estava.

Era uma mulher que estava de mal com a vida. Uma mulher que deixava claro em suas atitudes que não gostava de gente. Que não tinha a menor consideração pelas pessoas e pelos seus sentimentos e temores alheios. Faltava-lhe sensibilidade para trabalhar com gente! Reclamei para o dentista. Exerci os meus direitos de cliente. Sabe o que eu ouvi daquele dentista brilhante, que foi meu aluno.

- Roberto, esta mulher realmente é uma vaca. Não é a primeira reclamação que eu tenho dela. Você tem toda razão. O problema é que ela é parente do diretor da clínica e não tem como tirar ela de lá.

Bem, eu até que não me importei com isto. Desde que eu não tenha que fazer novas radiografias.

O serviço foi melhor do que eu esperava. As novas resinas, nas mãos daquele brilhante dentista fizeram milagres em minha boca. O meu sorriso ficou outro. Eu que não sou lá muito de sorrir passei a sorrir mais. Que bom!

Dentista agora só depois de mais vinte e cinco anos, jurei para mim mesmo. Que nada! As resinas por melhores que sejam, não duram tanto quanto os velhos amálgamas. Já está na hora de voltar ao dentista. Naquele que eu fui, nem pensar. Eu poderia trombar com aquela jabiraca novamente. E eu não tenho coragem suficiente para mandar ela para o lugar de onde ela nunca deveria ter saído.

Jamais me esquecerei do rosto daquela torturadora nazista. Nós guardamos para sempre em nossas mentes todo fato temperado com emoções. Quanto mais fortes as emoções, mais eternas serão as lembranças. Eu me lembro do rosto daquela "mulher" ainda hoje. Esta será a minha sina... Do lindo rosto que saiu chorando antes de mim eu não consigo me lembrar, por mais que eu me esforce. Coisas da vida!


* Dr. Roberto Caproni - É graduado em Odontologia pela UFMG e em Administração de Empresas. Pós-graduado em Marketing e em Ciências do Comportamento.
Possui cursos de marketing com as maiores autoridades mundiais  do assunto.
É consultor  de marketing e ministra palestras e cursos sobre Marketing Aplicado à Saúde no Brasil e no Exterior.
É autor do livro best seller Marketing Interpessoal – O Contato direto com o cliente.
Mais informações sobre o tema poderão ser obtidas no site www.caproni.com.br ou pelo telefax (031) 3773-7301.  

A reprodução dos textos de autoria de Roberto Caproni em jornais, revistas, boletins informativos, sites, fax, e-mail ou qualquer outro veículo de divulgação é PERMITIDA desde que citado o autor e o endereço eletrônico www.caproni.com.br

PRIMEIRA PÁGINA

EDIÇÕES ANTERIORES

ARQUIVO DE LEGISLAÇÃO

FALE CONOSCO