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Ano VI - Nº 80 - Janeiro de 2004 - 2ª Quinzena
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O aumento da carga tributária para as empresas prestadoras de serviços odontológicos

Nota de atualização*

Ricardo Alves Barreira Lourenço*

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O governo publicou a Medida Provisória de nº 135/03, que de um lado instituiu a cobrança não cumulativa da COFINS e de outro majorou sua alíquota de 3% para 7,6%. Alguns aspectos devem ser elucidados para que se entenda porque esta legislação trouxe real aumento da carga tributária para empresas prestadoras de serviço – caso das empresas prestadoras de serviços odontológicos.

A COFINS antes e depois da MP 135/03

A Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) era calculada, por todas as empresas, aplicando-se a alíquota de 3% sobre o valor total das faturas e receitas auferidas durante o mês. O mesmo cálculo e respectivo pagamento eram feitos por todas as empresas de uma mesma cadeia produtiva, gerando o chamado "efeito cascata" da cobrança do tributo.

Utilizaremos o exemplo de uma cadeia produtiva, cujo produto é uma escova dental. A empresa que extraía e/ou produzia a matéria prima para a produção da escova, ao vender certa quantidade de matéria prima para a empresa produtora, faturava e, portanto, pagava COFINS sobre o valor da fatura. A empresa produtora, ao vender a escova para a farmácia, também emitia fatura e, sobre este valor, pagava o mesmo percentual de 3%. Ao final, a farmácia, quando vendia a escova para um consumidor, emitia a nota fiscal e o valor da escova também era tributado pela contribuição. Observa-se que a mesma matéria prima foi tributada três vezes: uma quando foi vendida pela primeira empresa, outra quando, já na forma de escova, foi vendida para a farmácia e novamente na venda para o consumidor.

A nova regra pretende acabar com este efeito. O cálculo que antes era feito de forma simples, passa a ser feito com o abatimento dos valores de compra de insumos, mercadorias e prestação de serviços pela empresa emissora da fatura.

No mesmo exemplo da escova dental, isso significa que a empresa produtora da escova, quando fizer o cálculo para o pagamento da COFINS, abaterá o valor da compra dos insumos utilizados na produção da escova. Se os insumos custaram R$ 10,00 (portanto, 30 centavos de COFINS) e a venda de um pequeno lote de escovas para a farmácia gerou receita de R$ 15,00 (45 centavos de COFINS), a empresa produtora abaterá o valor da compra (30 centavos) do valor proveniente da receita (45 centavos), pagando, a título de COFINS, o restante (15 centavos). A farmácia fará o mesmo procedimento: ao vender o lote de escovas para o consumidor, abaterá o valor que pagou para obtê-las da empresa produtora.

Ocorre que, para compensar a perda destes "centavos", o governo majorou a alíquota para 7,6% sobre o valor da fatura. Nas análises econômicas divulgadas até o momento, não houve real diminuição de arrecadação – havendo até quem tenha defendido possível aumento.

Por que as empresas prestadoras de serviços saem perdendo?

Entendido este princípio questiona-se: Por que então a empresa prestadora de serviços é a que mais sofre com a nova legislação? A resposta é simples: Na prestação de serviços, o maior custo da empresa é a remuneração de profissionais, que não é objeto de abatimento para o cálculo da nova COFINS.

As empresas prestadoras de serviços, principalmente serviços técnicos e especializados (odontológicos, médicos, advocatícios, educacionais, etc.) têm como principal custo a remuneração de seus profissionais. Também é o valor da hora do profissional a principal fonte de receita da empresa – que será tributada pela COFINS. Esta hora de trabalho, fonte de despesa e receita, não é dedutível do cálculo da COFINS, mas é tributável.

De forma resumida, podemos dizer que a nova legislação prevê as seguintes despesas como dedutíveis: a) bens adquiridos para revendas; b) bens e serviços utilizados como insumos na prestação de serviços (incluídos combustíveis e lubrificantes); c) energia elétrica consumida pelo estabelecimento; d) aluguéis de prédios, máquinas e equipamentos, desde que pagos a pessoas jurídicas; e) despesas financeiras com empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil; f) máquinas e equipamentos incorporados ao ativo imobilizado da empresa, desde que utilizados na prestação dos serviços; g) edificações e benfeitorias realizadas nos imóveis (próprios ou de terceiros), utilizados nas atividades das empresas e h) bens recebidos por motivo de devolução.

Fazendo um último comparativo, uma empresa prestadora de serviços odontológicos poderia abater do cálculo da COFINS todo o custo mensal com aluguel (se pago à pessoa jurídica), luz, artigos de escritório utilizados no setor administrativo, produtos adquiridos para a prestação do serviço (luvas cirúrgicas, algodão, fio dental, papel toalha, etc.), bens adquiridos que farão parte do ativo imobilizado (como uma nova cadeira para pacientes, aparelhos odontológicos, computadores, etc.) ou aluguel de tais bens, desde que efetivamente pagos à pessoa jurídica, custo de eventuais obras feitas no consultório e custos financeiros com empréstimos ou financiamentos. Sobre estes valores será aplicada a alíquota de 7,6% e o total será abatido dos 7,6% calculados sobre o valor das receitas.

Este é o problema enfrentado pelas prestadoras de serviços. A atividade humana – essência da prestação de serviços especializados – é o principal gasto das empresas e o diferencial que apresenta ao mercado. A nova legislação prejudica a prestadora que investe no profissional e o remunera com decência e dignidade.

A Medida Provisória entrará em vigor em fevereiro de 2004 e, a partir do primeiro dia útil do mês, passará a surtir seus regulares efeitos jurídicos. Posteriormente poderá ser alterada, vez que o processo de conversão da Medida Provisória em Lei permite a apresentação de emendas ao texto. Assim, aconselhamos o acompanhamento, de perto, das discussões legislativas e eventuais modificações no texto.

Porém, é importante estar preparado. Caso o processo legislativo não seja concluído até fevereiro de 2004 ou não sejam feitas alterações nesta nova legislação, caberá ao setor de serviços decidir se repassará este novo custo para o paciente ou se arcará com o prejuízo.


*Nota de atualização

O artigo acima havia sido escrito antes da publicação da Lei 10.834, de 29 de dezembro de 2003, que consolidou a Medida Provisória. Embora a mídia tenha veiculado que a área de saúde estaria excluída da nova tributação, a verdade é que somente os hospitais, prontos-socorros, casas de saúde/recuperação e bancos de sangue, não seriam afetados.

A boa notícia é que as empresas que recolhem os tributos federais pelo Lucro Presumido também ficarão de fora da nova sistemática e continuarão com o recolhimento de 3%. Alívio para os pequenos e médios prestadores de serviços.


* Ricardo Alves Barreira Lourenço, advogado formado pela PUC-SP, Sócio da Advocacia Muzzi em São Paulo.
  E-mail: ricardo.lourenco@muzziadv.com.br

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